O Reajuste por Faixa Etária nos Planos de Saúde e a Tese Vinculante do Tema 952 do Superior Tribunal de Justiça
- Rafael de Amorim
- 30 de mar.
- 4 min de leitura
1. Introdução
A prática de reajustar mensalidades de planos de saúde com base na mudança de faixa etária dos beneficiários constitui tema de significativa relevância no âmbito do Direito à Saúde e do Direito do Consumidor. Diante das controvérsias instauradas nos tribunais pátrios, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) enfrentou a questão sob a sistemática dos recursos repetitivos e, no julgamento do Recurso Especial nº 1.568.244/RJ, fixou a tese vinculante de número 952, estabelecendo os parâmetros de legalidade e validade para tais reajustes.
Este artigo tem por escopo analisar o conteúdo e os efeitos da referida tese, situando-a no contexto normativo e jurisprudencial que rege os contratos de assistência à saúde, com especial atenção à proteção do consumidor idoso.
2. Contextualização Fática e Jurisprudencial
Como cenário hipotético, imagine-se uma beneficiária de plano de saúde individual contratado em 1990, portanto anterior à entrada em vigor da Lei nº 9.656/1998, cuja mensalidade sofre aumentos sucessivos em razão de sua idade, sem indicação contratual clara dos percentuais aplicados e sem respaldo técnico-atuarial acessível. Ocorrem aumentos de mais de 30% ao completar 61 anos e outros 37% aos 66 anos de idade.
Casos como esse têm ensejado o ajuizamento de ações judiciais que buscam a declaração de abusividade dos reajustes e a restituição dos valores pagos indevidamente. Nos Tribunais de Justiça, a análise da legalidade dessas cláusulas e reajustes é feita com base na tese fixada no Tema 952 do STJ, conforme se exemplifica nos julgados a seguir.
3. A Tese Repetitiva do Tema 952 do STJ
A Segunda Seção do Superior Tribunal de Justiça, ao julgar o Recurso Especial nº 1.568.244/RJ, firmou a seguinte tese para fins do artigo 1.040 do Código de Processo Civil:
“O reajuste de mensalidade de plano de saúde individual ou familiar fundado na mudança de faixa etária do beneficiário é válido desde que (i) haja previsão contratual; (ii) sejam observadas as normas expedidas pelos órgãos governamentais reguladores; e (iii) não sejam aplicados percentuais desarrazoados ou aleatórios que, concretamente e sem base atuarial idônea, onerem excessivamente o consumidor ou discriminem o idoso.”
Trata-se de orientação que visa compatibilizar a necessidade de equilíbrio econômico-financeiro dos contratos com a proteção do consumidor, sobretudo os em situação de vulnerabilidade, como os idosos.
4. Preceitos Normativos Aplicáveis
A legalidade e a validade do reajuste por faixa etária estão condicionadas à observância de diversos diplomas normativos, entre os quais se destacam:
4.1. Código de Defesa do Consumidor (Lei nº 8.078/1990)
Art. 6º, III – Garante ao consumidor o direito à informação adequada e clara sobre os diferentes produtos e serviços.
Art. 51, §1º, IV e §2º – Considera nulas de pleno direito as cláusulas contratuais que estabeleçam obrigações iníquas, que coloquem o consumidor em desvantagem exagerada, bem como permite a revisão judicial de cláusulas excessivamente onerosas.
4.2. Lei dos Planos de Saúde (Lei nº 9.656/1998)
Art. 15, caput – Autoriza a variação das contraprestações pecuniárias dos planos privados de assistência à saúde em razão da idade do usuário, desde que tal variação esteja prevista no contrato e observadas as normas regulamentares.
Art. 16, IV – Proíbe cláusulas que estabeleçam obrigações iníquas, abusivas ou que coloquem o consumidor em desvantagem exagerada.
4.3. Estatuto do Idoso (Lei nº 10.741/2003)
Art. 15, §3º – Veda a discriminação do idoso nos planos de saúde pela cobrança de valores diferenciados em razão da idade.
5. A Resolução Normativa nº 63/2003 da ANS
A Resolução Normativa nº 63/2003 da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) dispõe sobre os critérios de variação de preço em função da idade nos planos de saúde e é de observância obrigatória para contratos celebrados a partir de 1º de janeiro de 2004.
Principais trechos relevantes:
Art. 3º – “Os contratos de planos privados de assistência à saúde devem conter, de forma clara e objetiva, a informação de que a variação de preço em função da idade é permitida, com a discriminação das faixas etárias e dos percentuais de variação.”
Art. 5º – “A variação de preço em função da idade deve observar as seguintes faixas etárias: 0 a 18 anos; 19 a 23 anos; 24 a 28 anos; 29 a 33 anos; 34 a 38 anos; 39 a 43 anos; 44 a 48 anos; 49 a 53 anos; 54 a 58 anos; e 59 anos ou mais.”
Art. 6º, §1º – “O valor fixado para a última faixa etária (59 anos ou mais) não poderá ser superior a seis vezes o valor fixado para a primeira faixa etária.”
O descumprimento desses dispositivos acarreta, conforme entendimento pacificado no STJ, a nulidade da cláusula contratual que prevê o reajuste por faixa etária.
6. Jurisprudência Selecionada
6.1. Agravo Interno no REsp nº 0303874-97.2009.8.19.0001 – TJRJ
“Pretende o recorrente reabrir discussão acerca dos valores das mensalidades e da forma de reajuste do plano, o que torna, por si, imperativa a inadmissão do seu Agravo Interno.” “A decisão agravada observou os parâmetros dos Temas 952 e 1034 do STJ, reconhecendo a inexistência de abusividade no reajuste, diante da comprovação de que se tratava de repasse da contribuição anteriormente paga pelo empregador.”
6.2. Agravo de Instrumento nº 0003944-34.2025.8.19.0000 – TJRJ
“É abusivo o reajuste de plano de saúde pelo índice que melhor atende aos interesses do fornecedor, sem que se acorde ou se dê ao consumidor qualquer informação a respeito do critério adotado.” “A cláusula de reajuste permanece demasiadamente aberta, imprevisível, não tendo o segurado qualquer elemento que lhe permita antever o aumento a ser suportado, o que ofende o direito de informação do consumidor, prescrito no art. 6º, III, do CDC.”
7. Conclusão
A tese firmada no Tema 952 do STJ confere previsibilidade e segurança jurídica ao disciplinar os requisitos de validade do reajuste por faixa etária nos planos de saúde. Mais do que uma diretriz abstrata, trata-se de um verdadeiro instrumento de concretização dos direitos do consumidor e de limitação da autonomia contratual em favor da boa-fé objetiva e da proteção ao idoso.

8. Referências
BRASIL. Código de Defesa do Consumidor (Lei nº 8.078/1990).
BRASIL. Lei dos Planos de Saúde (Lei nº 9.656/1998).
BRASIL. Estatuto do Idoso (Lei nº 10.741/2003).
AGÊNCIA NACIONAL DE SAÚDE SUPLEMENTAR. Resolução Normativa nº 63/2003.
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. REsp 1.568.244/RJ, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino.
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO. Agravo Interno nº 0303874-97.2009.8.19.0001.
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO. Agravo de Instrumento nº 0003944-34.2025.8.19.0000.
Se desejar, posso salvar este texto em PDF ou Word com formatação acadêmica (ABNT ou outro estilo). Também posso preparar um artigo mais conciso para publicação em rede social ou blog jurídico. Deseja seguir com algum desses formatos?
Comments